quinta-feira, 1 de junho de 2017

Esse jogo de corrida.

Correndo e aprendendo a jogar. Não parece, mas a corrida é um jogo. Um tipo de jogo que não começa apenas quando calçamos os tênis e nem termina quando cruzamos o pórtico de chegada. É o jogo do dia a dia! Um bom jogador é aquele que sabe identificar o momento, sabe a hora de forçar nos treinos, sabe a hora certa de descansar antes da lesão, sabe a hora de colocar uma ou outra corrida no calendário e sabe a hora de recalcular as coordenadas para retomar o caminho da vitória. Sem modéstias, acho que estou aprendendo a jogar esse jogo.

Há duas semanas decidi correr o percurso de 21km da Seven Run. Prova bem organizada, praticamente plana, e com largada às 18:00 horas, ou seja, a temperatura estaria bem amena. Enxerguei a possibilidade de realizar um treino de ritmo diferenciado, numa distância que eu adoro correr; os 21 km. Bastava fazer um ajuste nos treinos da maratona e adiantar, em uma semana, um treino longo de 28 Km. Sem problemas.

Enfim, dia 20 de maio, 18:00 horas, lá estava eu pronto pra realizar o meu treino longo antecipado. O local escolhido:  o Elevado João Goulart, vulgo, o Minhocão. Algumas pessoas não entendem o porquê de eu gostar de realizar treinos no Minhocão. A resposta é bem simples; o Minhocão não tem curvas, o asfalto está sempre conservado, sem buracos e é um percurso razoavelmente técnico, com alguns aclives e declives moderados. Além, é claro, do apreço que tenho pelo Centro de São Paulo. Sem nojinho, hein! Como já cantou o Premê: “Não vá se incomodar com a fauna urbana de São Paulo”!

Pois bem, segundo o que imaginava da evolução dos meus treinos, faria esse treino longo “de buenas” num ritmo de 5’35”/km, aproveitando a brisa da noite paulistana, espiando as janelas dos prédios que margeiam o Minhocão, que nos protege como as copas das árvores dos parques mais movimentados. O treino começou bem, correndo naquele retão tive tempo de pensar na vida, colocar algumas situações em perspectiva, fazer planos. Corrida é sessão de terapia, é balcão de bar.

As primeiras duas horas de treino foram bem tranquilas. Mas, de repente, a temperatura esfriou, o asfalto enrijeceu, as pernas começaram a pesar, o meu joelho, na verdade, a patela, começou a reclamar. Eu ainda tentei ponderar com ela: - Condromalácia, sua linda, falta pouco, não me abandone agora! Não teve jeito. Já tinha percorrido 26 km, quando o tal do Muro apareceu em minha frente. E era intransponível. Sentia dores no quadril, nos glúteos, tinha impressão o meu joelho flexionaria do lado errado, não conseguia correr. Não sobrou energia pra nada. Voltei pra casa derrotado, como se tivesse perdido o pênalti decisivo numa final de campeonato.

E ainda tinha os 21 km, da Seven Run, na semana seguinte. Resolvi passar uma semana inteira sem correr. Nem me lembro da última vez que passei por tal abstinência. Aproveitei a semana pra dormir um pouco mais, alongar, aplicar gelo nos joelhos e fazer os treinos de fortalecimento na academia. Bateu uma tensão no sábado, no dia da prova. Já corri a distância (21km) outras tantas vezes, mas, o fiasco da semana anterior acendeu o sinal de alerta. Comecei a questionar os meus treinos, a preparação pra maratona, as minhas condições físicas atuais. Será que deveria estar treinando com um treinador? Será que essa tal de condromalácia patelar ia impedir a minha maratona? Será que vai valer a pena todo o sacrifício? 42 anos e dúvidas.

Quase 18:00 horas. A temperatura, a exemplo  da semana passada, estava amena. Mas eu não. Estava tenso na largada. Não me lembro de ter sentido tamanho arrepio na espinha. O medo do fracasso, pra quem não tem medo de falar em público, é maior que o medo da morte. E pra quem corre, esse medo é traduzido na imagem no corredor sentado no meio fio, chorando de dores e resgate do carro da organização. Não é exagero. Todo corredor tem um pouco de samurai. Toca a sirene. Foi dada a largada. A partir de agora, menos reflexão e mais pulsação.

A Seven Run é uma corrida curiosa. Eram três percursos diferentes; o de 7km,  o de 14 km e o de 21 km. Todo mundo largou junto, em ondas de ritmo. Foi uma boa ideia. Correr ao lado de alguém que faria um terço da minha distância, por exemplo, permitiu que eu mantivesse, desde o início o meu ritmo de corrida. Corredores de longa distância tendem a economizar no início da prova pra não ter prejuízo depois. Resolvi abdicar do monitoramento de cronômetros e aplicativo. Sem toda essa tecnologia, a corrida tende a ficar mais leve, menos compromissada. Corri por 11 km e percebi que ainda estava muito bem. Sem dores, sem desconforto. Resolvi acelerar um bocadinho mais. 15Km, 18km e meu ritmo não diminuía. Faltava pouco. Só iria parar quando cruzasse a linha de chegada.

Cheguei com 01h47min14segs. Meu melhor tempo nos 21 km. Foi muito legal terminar bem a prova, sem dores e com gás no tanque. Mas, além disso, foi importante ter aprendido mais um movimento nesse jogo que é a corrida. Aprendi que o descanso é importante, mesmo quando a planilha diz outra coisa. Aprendi que um treino ruim, desastroso, na maioria das vezes, não é o fim do mundo, é só um treino ruim. Aprendi que a corrida é um jogo de erros e acertos. Ainda cometerei vários erros na minha preparação para maratona. Sei disso. Mas é a forma como supero esses erros que fará toda a diferença na reta final.

Playlist:

Não tenho ouvido muita música durante as corridas, por isso, essa semana não vai ter playlist. Em compensação trago aqui um filme pra qualquer um largar as cobertas, saltar da cama e começar a correr. É o filme “Spirit of the Marathon”, disponível no Youtube e acompanha a preparação de alguns atletas amadores e profissionais para a Maratona de Chicago. De arrepiar. Segue o link:  




   


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